Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
A 15ª Conferência das Partes (COP 15) da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (CQNUMC), chamada também de Cúpula sobre o Clima, será realizada no mês que vem em Copenhague, onde líderes mundiais discutirão o próximo tratado sobre o clima, já que o Protocolo de Quioto expira em 2012. Neste protocolo, que foi aprovado em 1997 e ratificado em 2005, os países desenvolvidos comprometeram a reduzirem suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 5,2% aos níveis de 1990 no período de 2008 a 2012.
Acordo não cumprido e nem seguido por vários paises (incluindo os EUA, o maior poluidor do planeta), seus resultados pífios provocaram um descontrole climático que chegou a tal nível, que hoje impactos já são sentidos por todos os povos do planeta: derretimento das geleiras, elevação do nível dos oceanos, secas extremas, aumento da freqüência e da intensidade dos tornados e furacões, alterações no regime de chuvas, perdas agrícolas, surgimento de novas doenças e a extinção de espécies da fauna e da flora.
Nas discussões que antecedem a Conferência de Copenhague os países do G8 (formado pelos sete países mais desenvolvidos do mundo, e a Rússia), de fato os grandes responsáveis pelo aquecimento global, concordam em reduzir suas emissões de GEE em 80% até 2050, em relação aos níveis de 1990, desde que os países em desenvolvimento se comprometam a arcar com uma redução de 50% no mesmo período.
No entanto, paises em desenvolvimento não concordam em serem obrigados a terem metas estabelecidas, e sim, ações voluntárias. Alegam que as mudanças climáticas não foram causadas por eles. Talvez, até esses mesmos paises possam concordar, caso haja o estabelecimento de metas vinculando-as à ajuda financeira dos países desenvolvidos.
Convenhamos que para termos um plano sério em qualquer tema ou área, deve ter objetivos e ações que possam ser mensuráveis, verificáveis e relatáveis. Isso se traduz em metas e compromissos para os diferentes setores da economia e da sociedade, bem como responsabilidades e atribuições para os diferentes níveis de governo.
Em parte, os países em desenvolvimento podem até ter razão, mas, por outro lado, é de suma importância perceber que o planeta é um só, nossa espécie é única e que os efeitos da poluição e das mudanças climáticas ultrapassam fronteiras. O fato é que já passou a hora de discutir quem polui mais, quando o que está em jogo é a possibilidade de vida na Terra para as futuras gerações. Devemos fazer todo o possível para estabilizar o clima, evitando que o aquecimento da Terra provoque a devastação da biodiversidade e o holocausto de milhões de pessoas, cujos territórios não serão mais habitáveis, especialmente na África e no sudeste asiático. Não há mais tempo! Como disse o poeta “Quem sabe faz a hora não espera acontecer”. Nosso tempo de agir já está se esgotando!
Nosso país tem uma importância fundamental em Copenhague, já que somos o detentor do maior potencial ambiental do planeta.
Lamentavelmente o que se verifica são ações contraditórias do governo brasileiro, que nada ajudam na sua credibilidade para tentar resolver o problema ambiental. Esta contradição está evidenciada no Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC) que apresenta pontos polêmicos, como a construção de usinas hidrelétricas e nucleares como forma de evitar emissão de gases de efeito estufa. O plano incentiva obras contestadas pela sociedade civil, como as usinas de Belo Monte, no rio Xingu (PA) e Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira (RO). O PNMC considera as florestas como ponto importante, mas apenas apresenta medidas para a redução do desmatamento ilegal. Não podemos esquecer que o Brasil é o quarto maior emissor de gases de efeito estufa graças ao desmatamento desenfreado, principalmente da Amazônia, e o plano deveria traçar metas para acabar com o desmatamento por completo, e não apenas o ilegal.
Enquanto se delineia a proposta brasileira a ser apresentada em Copenhague, com a redução de 40% nas emissões, o Senado brasileiro aprovou uma medida, no mínimo controversa, para a Amazônia, a Medida Provisória - MP 458, que legaliza a grilagem em terras públicas na Amazônia, e que possibilitará que mais de 67 milhões de hectares de terras públicas da Amazônia sejam doadas ou vendidas sem licitação, premiando assim invasores e grileiros, o que certamente irá estimulará ainda mais a derrubada da floresta.
E a descoberta de petróleo na camada pré-sal pela Petrobrás? Após tantos fatos desaconselhando o emprego de fontes fósseis de energia em virtude de sua nocividade ao meio ambiente, não seria antipático e anti-ético os brasileiros estarem festejando a descoberta de mais uma fonte de agressão a este nosso planeta já tão maltratado? Será que a Terra suporta a queima de mais esses bilhões de barris de petróleo? Não seria mais razoável o Brasil se orgulhar de liderar a aplicação de fontes de energia renovável em lugar do sujo petróleo?
Verifica-se também que o cenário definido pelos leilões de energia nova realizados recentemente apontam no sentido que o preço da energia elétrica vai aumentar de forma incontrolável e a matriz energética do país ficará mais suja, com a ampliação de geração termelétrica a base de óleo combustível, diesel e carvão mineral. Com isso, o Brasil segue na direção inversa dos países desenvolvidos, que buscam aumentar a participação de fontes renováveis nas suas matrizes energéticas.
Também ressalta-se a posição do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – Ibama que concedeu a Licença de Instalação (LI) da usina hidrelétrica de Jirau, no rio Madeira (RO). A LI foi concedida sem a aprovação da própria equipe técnica do Ibama, que deu parecer contrário à construção.
Sem dúvida os desafios da humanidade são enormes, principalmente porque exigem algumas mudanças de hábitos e de atitudes muito enraizados na vida das pessoas. É preciso reduzir as emissões de gases que resultam da queima dos derivados de petróleo, o principal emissor de GEE. Espera-se que em Copenhague sejam estabelecidos limites severos ao uso de combustíveis fósseis. Eles foram os responsáveis pelo progresso da humanidade no passado, mas o futuro hoje não é visto como mais petróleo, mais gás e mais carvão mineral, e sim com mais energias renováveis. O petróleo simplesmente não é o caminho de um desenvolvimento sustentável. Investir mais nas tecnologias para melhor aproveitar a energia solar, dos ventos e a biomassa, parece um caminho mais seguro.
A condição para que possamos conseguir vencer este que é o maior desafio à raça humana, a luta contra o aquecimento global, é tentar identificar verdadeiramente o problema e, posteriormente, verificar quais escolhas que cada um de nós pode realizar e como o conjunto destas escolhas individuais se interliga numa estratégia coletiva. Teremos que aprender a identificar todos estes conjuntos de relações, sua interdependência e a importância do nosso papel como cidadãos.
Cabe a sociedade civil mundial se organizar para pressionar os governos a agirem nesta Conferência, a fim de garantir que o acordo a ser estabelecido em dezembro de 2009 preveja medidas efetivas para a redução de emissões de GEE, e assim salvar o planeta. É crucial a mobilização de cada um, visto que a nossa espécie encontra-se em risco de ser extinta da Terra, como resultado das ações inconseqüentes dos seus habitantes que ameaçam sua própria condição de sobrevivência.