terça-feira, 15 de setembro de 2009

O Brasil (Nordeste) não precisa de usinas nucleares

Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco

Segundo previsão do Plano Nacional de Energia 2030 – PNE 20030 (Estratégia para a Expansão da Oferta), divulgado pela Empresa de Pesquisa Energética –EPE, o Brasil deverá construir mais quatro usinas nucleares até 2030, duas das novas unidades nucleares com potência de aproximadamente 1 milhão de kW cada poderão ser construídas na região Nordeste e as outras duas no Sudeste. Além de Angra 3, que já está incluída no Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica (PDEE) 2006-2015.

Paralisadas há 20 anos, as obras da usina nuclear de Angra 3 (1,35 milhão de kW) foram retomadas. É estimado para agosto de 2013 a entrada de operação da terceira usina termonuclear brasileira, com investimentos da ordem de R$ 7 bilhões.

A elaboração destes planos de expansão da oferta energética sofre de um erro de origem: a ausência da sociedade no debate da questão energética, e sua efetiva participação no processo decisório. A ampliação do espaço de debate é fundamental para tornar politicamente sustentável o processo de decisão. O debate energético não pode permanecer confinado nas mesas e gabinetes de “experts”, hábeis na manipulação de números e de conceitos, buscando na epistemologia das ciências a legitimação das decisões que afetam toda a sociedade.

O Brasil não tem necessidade de construir mais usinas nucleares para aumentar a oferta de energia elétrica. Estas decisões referentes à construção de usinas de geração de eletricidade têm sido apresentadas diante de um suposto aumento dos riscos de déficit de energia, alimentadas pela síndrome do apagão. Fonte de energia elétrica ambientalmente danosa por causa dos riscos de acidentes e pela produção de resíduos radioativos, também chamados de lixo atômico; o uso da nucleoeletricidade pelo Brasil é estrategicamente incorreto, e deveria ser definitivamente descartado. Parece-me mais inteligente buscar formas de aumentar a eficiência e a conservação de energia, e de encontrar na diversidade das fontes renováveis as múltiplas saídas para os problemas energéticos do país.

O Brasil tem hoje aproximadamente 70 usinas hidrelétricas com mais de 20 anos de construção, que poderiam sofrer uma repotenciação (troca de equipamentos, por ex. substituição do rotor do gerador, ou modernização de componentes e sistemas). Se isso fosse feito, proporcionaria a mais, cerca de 8.000 megawatts. O custo é bem menor comparado à construção de novas usinas. Uma economia de aproximadamente 4.850 megawatts poderia ser obtida sem nenhuma nova obra civil, bastando que se investisse na redução das perdas do setor elétrico nacional, que hoje, desde a transmissão até chegar ao domicílio ou ao consumidor industrial, são da ordem de 15%. Se houvesse um esforço para que o desperdício fosse reduzido para 10%, isso já seria suficiente para essa economia. Outra possibilidade concreta de reduzir a necessidade de construção de novas centrais elétricas seria a substituição do chuveiro elétrico por sistemas de aquecimento solar. Conforme levantamentos, cerca de 8% do consumo nacional de energia elétrica é usado no aquecimento de água para banho. Essa substituição representaria uma economia importante, visto que o sistema energético brasileiro tem atualmente cerca de 100 mil megawatts de potência instalada.

Lamentavelmente a opção nuclear é a opção preferencial, em detrimento da busca pela eficiência energética e adoção de matrizes energéticas renováveis.Constata-se assim, que o governo não dá muita importância à adoção de novas matrizes de energia renovável no país, revelando pouco apreço pela busca da eficiência energética, do uso racional e de novas fontes de energia. As energias renováveis são relegadas no PDEE, enquanto deveriam ser encaradas como a grande solução para a questão energética. Embarcar no caminho da energia nuclear traz controvérsias, é polêmico, tem um custo muito elevado e destoa do rumo que seria mais interessante para o Brasil.

Não faltam opções técnicas para a segurança energética de médio e longo prazo. O Brasil, já é capaz de produzir em quantidade energia solar térmica (aquecimento de água), solar fotovoltaica (eletricidade solar), eólica e bioeletricidade (produzida a partir da queima de resíduos agrícolas ou outro material orgânico), entre outras, e só não o faz por falta de promoção dessas tecnologias. Para isso deveria fornecer subsídios (prêmios e linhas de crédito), aplicar medidas de apoio (como campanhas públicas e educação ambiental), dar incentivos fiscais (tanto para quem fabrica os equipamentos, como para o usuário) criar legislação para a obrigatoriedade de instalações, ou de preparação para a instalação dos equipamentos.

O governo segue desconsiderando a tendência internacional de incentivar e apoiar as fontes renováveis de energia, apesar do país possuir potencial para suprir totalmente a demanda nacional atual, e também para fornecer eletricidade a locais remotos que não a possuem ou que utilizam outras fontes como a geração a diesel ou a gás. Ao desprezar as fontes renováveis, o país acaba deixando de economizar energia, e de contribuir na diminuição das emissões de gases de efeito estufa.Como podemos observar, a temática da oferta da energia traz questões de ordem política decorrente da forma como as diferentes opções energéticas são impostas a sociedade. O tratamento da questão energética em nosso país continua a revelar a prevalência da visão liberal-mercantilista, que concebe o setor energético como um campo de relações de troca de mercadorias.

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