terça-feira, 30 de junho de 2009

O neo pelego

Heitor Scalambrini Costa

Professor da Universidade Federal de Pernambuco

No instrumental dos peões, pelego é um pano grosso e dobrado, ou uma pele de carneiro curtida, mas ainda com a lã, que se coloca em cima do arreio. O cavaleiro monta sobre o pelego antes de montar sobre o cavalo. Conforme o mestre Aurélio, pelego é: a pele do carneiro com a lã; pele usada nos arreios à maneira de xairel; indivíduo subserviente, capacho. É sobre essa última definição que quero comentar.

O termo pelego foi popularizado durante o governo de Getúlio Vargas, nos anos 1930. Imitando a Carta Del Lavoro, do fascista italiano Benito Mussolini, Vargas decretou a Lei de Sindicalização em 1931, submetendo os estatutos dos sindicatos ao Ministério do Trabalho. Pelego era então o líder sindical de confiança do governo que garantia o atrelamento da entidade ao Estado. Décadas depois, o termo voltou à tona com a ditadura militar. Pelego passou a ser o dirigente sindical apoiado pelos militares, sendo o representante máximo do chamado sindicalismo marrom. A palavra, que antigamente designava a pele ou o pano que amaciava o contato entre o cavaleiro e a sela, virou sinônimo de traidor dos trabalhadores e aliado do governo e dos patrões. Logo, quando se chamado de pelego, significava que a pessoa era subserviente/servil/dominada por outra, ou seja, capacho, puxa-saco, bajulador.

Mas como se pode definir esse trabalhador que se acovarda, que aceita tudo o que o patrão e o governo querem, sem questionar? Pelego é trabalhador que se deixa montar pelo patrão e/ou pelo governo; é o que não consegue reagir frente à humilhação; é quem não luta por seus direitos, por medo das conseqüências; é o pusilânime que se esconde atrás de desculpas esfarrapadas para justificar a própria covardia; o que não tem coragem de lutar, o(a) COVARDE, enfim, o que se esconde atrás daqueles que lutam, aproveitando da peleja alheia como um parasita. Pelego é aquele trabalhador que não sabe o significado da palavra solidariedade, o egoísta que não consegue ver nada além de suas próprias e momentâneas necessidades; é aquele(a) que, terminada a greve, não consegue olhar nos olhos de seus companheiros, porque se sente uma sub-pessoa, uma não-gente, pois lhe falta uma parte essencial a todo ser humano que se preze: o brio, a coragem, o amor próprio, a nobreza de caráter, enfim.

Em tempos mais recentes, com a eleição do governo Lula, presidente originário do movimento sindical, os movimentos sociais foram cooptados e trazidos para dentro do aparelho do Estado, e lá eles se neutralizaram, se anestesiaram, se despolitizaram. O “oficialismo” tirou qualquer possibilidade de crítica e de reivindicação política. Os sindicalistas, militantes tornaram-se assim, em muitos casos, funcionários do governo. E agora, quem arbitra e decide tudo é o presidente. De fato, esses movimentos, os trabalhadores e muitos sindicatos confundiram a necessária postura de autonomia que deveriam manter em defesa dos direitos dos trabalhadores, e não souberam lidar com esta realidade. Tornaram-se parceiros, associados do governo e dos patrões, chamados agora de neo pelegos. Todos irmanados no mesmo interesse, como se fosse possível apagar, negar as classes sociais. Como se não existisse mais o capital e o trabalho. Existe maior embuste? Sem deixar de mencionar que tiveram mais recentemente, aprovado o imposto sindical, e que recebem recursos financeiros de vários Ministérios e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Só a militância crítica há de nos livrar da sina de ser neo pelego. Afinal, a gente pode até morrer teso, mas nunca perdendo a pose. Tudo pode ser tirado, mas não se pode tirar a coragem de lutar de uma pessoa decidida. Recuso-me a sair da militância política pela construção de uma sociedade justa, solidária, que leve em conta a humanidade dos homens e mulheres em qualquer parte do mundo. Não é esta a grande e universal luta dos trabalhadores?

Ser neo pelego? Nenhum trabalhador ou trabalhadora jamais deveria passar por essa infâmia.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Manifesto por Eleições Diretas e Paritárias

Manifesto por

Eleições Diretas e Paritárias JÁ!

PARA DIRETOR DO CENTRO ACADÊMICO DO AGRESTE / UFPE

Heitor Scalambrini 

Com a democratização do país, nos anos ’80, a conseqüente democratização da estrutura universitária foi uma reivindicação que unificou as forças progressistas dos três segmentos que compõem a comunidade universitária, contra o entulho autoritário da ditadura. A supressão da democracia é uma agressão deprimente para o ambiente acadêmico, onde a liberdade do pensar e a pluralidade de idéias e ideais devem prevalecer. De lá para cá, apesar dos avanços, de vez em quando surgem retrocessos que precisam ser superados.

      Um exemplo de retrocesso se verifica hoje no Centro Acadêmico do Agreste onde, apesar do seu Projeto Político-Pedagógico prever eleições diretas e paritárias para Diretor do Centro, por questões que fogem ao entendimento democrático, passados mais de três anos de interinidade do atual Diretor, ainda não se implementou a eleição para a Direção do Centro. Some-se a isso a explícita posição do Magnífico Reitor, Prof. Amaro Lins, na defesa e construção da democracia na UFPE.

        Na nossa visão, a democratização na Universidade pressupõe a descentralização e o fortalecimento do poder de decisão e de gestão dos Centros. Obviamente, essas mudanças não se concretizam apenas com o processo eleitoral, mas sim com a efetiva participação da comunidade. Concomitante ao processo eleitoral, é necessário que se elabore o Regimento do CAA, baseado nos princípios da democracia, da qualidade do ensino e do compromisso social.

      Por isso, nós professores, técnico-administrativos e estudantes da Universidade Federal de Pernambuco reivindicamos a realização de eleições DIRETAS E PARITÁRIAS para o cargo de Diretor do Centro Acadêmico do Agreste. E, para tanto, encaminhamos ao Magnífico Reitor, este abaixo assinado, solicitando providências para que essa eleição seja realizada com a máxima brevidade. 


MOVIMENTO PRÓ-DEMOCRATIZAÇÃO DO CENTRO ACADÊMICO DO AGRESTE / UFPE




quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O desafio de nossa geração

Heitor Scalambrini Costa (hscosta@ufpe.br)
Professor da Universidade Federal de Pernambuco

Diferente daquele extraordinário 1968, onde idéias e causas libertárias empolgavam boa parte do mundo, e no Brasil a cena dominante era a forte efervescência política questionando a ditadura militar, vivemos nos últimos anos sob a tacanha do pensamento hegemônico, o do neoliberalismo.

Ao governo, na visão neoliberal, cabe criar e preservar certas condições que permitam ao mercado operar. É o capitalismo financeiro determinante dos fluxos de dinheiro, dos lucros obtidos, dos problemas econômicos, das crises dos países. O mercado decide, o mercado determina. É a chamada globalização financeira.

Decorrente da atual política neoliberal o mundo só conseguiu produzir menores taxas de crescimento, maior desigualdade social e crises recorrentes, e que culminaram com os graves problemas enfrentados na atualidade: a recessão-depressão econômica, a insegurança energética e alimentar, e o aquecimento global. E agora, avizinha-se uma conjuntura de desemprego e ampliação da miséria.

Ao longo dos últimos anos os governos adotaram as receitas neoliberais ditadas por organizações dirigidas pelos paises centrais, como a OMC, o Banco Mundial e o FMI, no âmbito dos programas de ajustamento estrutural e de redução da pobreza. Em nome da luta contra a pobreza, estas instituições convenceram os governos a executarem políticas que reproduziram e aumentaram a pobreza.

Os ideólogos do neoliberalismo, da desregulação da economia, do Estado mínimo e do laissez-faire dos mercados mentiram para toda a humanidade, prometendo-lhe o melhor dos mundos. Sem essa via não existiam alternativas, diziam. Tudo isso foi agora desmascarado com a explosão mundial da crise econômica e financeira em 2007-2008, mostrando o quão interligadas estão as economias do planeta.

Foram os processos de produção e consumo orientadores do sistema de desenvolvimento dominante, e a idéia de progresso como sinônimo de crescimento econômico, que levaram o planeta a uma situação na qual pode ser gerada uma alteração irreversível no clima, com conseqüências físicas, econômicas e sociais catastróficas para todos os países. Pelo menos, é o que pensam aqueles que atribuem boa parte dos atuais problemas à atividade humana.

Há aqueles ainda, que dizem que nunca antes na história da humanidade tantos viveram com tanta fartura, com tanta longevidade, com tanto conforto e com tantas opções para consumo. Contudo, estes privilegiados são poucos em relação aos mais de 6 bilhões de seres humanos que habitam o planeta na atualidade. Mais de 4 bilhões de pessoas vivem hoje com menos de 1 dólar por dia, segundo dados do Programa da Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e mais de um terço da população urbana mundial mora em favelas.

Logo, trazer toda a humanidade a um padrão de vida digno, com acesso a alimentação adequada, a saúde, a educação e oportunidades de trabalho é uma questão que passa pela mudança de paradigma, e constitui em um grande desafio. Visto que para continuar o crescimento da produção e do consumo atuais, como é proposto pelo modelo vigente, precisaríamos de mais de um planeta Terra, pois hoje já são consumidos recursos naturais a uma taxa 30% maior do que a Terra tem condições de repor. Aqui reside o limite do capital: o limite da Terra. Isso não existia na crise de 1929.

A conjugação destas crises e impasses mostra aos povos a necessidade de se libertarem da sociedade capitalista e do seu modelo produtivo consumista. A ligação entre as crises põe em evidência a necessidade de um programa anticapitalista e revolucionário em escala planetária. A humanidade não poderá contentar-se com meias medidas. É preciso arrancar o mal pela raiz. A direção das soluções deve ser no sentido em que elas sejam favoráveis aos povos e à natureza.

O que está em jogo, de fato, é a disposição das sociedades em reduzir e alterar drasticamente a forma de consumo, redefinir o modelo de produção e a idéia mesmo de desenvolvimento; e, em passar a medir o êxito de um país por seus indicadores sociais e ambientais, e não mais apenas por sua riqueza financeira.

Portanto, o desafio que se coloca neste início do século XXI é nada menos do que mudar o curso da civilização. É preciso construir uma nova ordem internacional, que respeite a soberania dos povos e das nações. Deslocar, num curto espaço de tempo, o eixo da lógica “viver é produzir sem fim e consumir o mais que pode” que leva a acumulação, para uma lógica em função do bem estar social, do exercício da liberdade e da cooperação entre os povos.

Há quem diga que um pesado imposto será cobrado das gerações futuras. Essa visão aumenta em muito a responsabilidade da atual geração. É fundamental que outras formas de relação do ser humano com a natureza sejam assumidas e que novas tecnologias, de alta eficiência na utilização de recursos naturais e com mínimos impactos ambientais sejam desenvolvidas e adotadas em larga escala.
Precisamos sim valorizar aspectos relativos às questões que sempre foram colocadas pelo ser humano: que sentido tem a vida e o universo, qual é o nosso lugar? Portanto, há que se ouvir mais os pensadores e os que ainda amam a vida e cuidam da Terra, do que os governos, os economistas, entre outros.